Sexta-feira, 7 de dezembro de 2012
Carta ao Pai Natal
Senhor Pai Natal
Como diz o meu amigo que mora na torre
em frente à minha barraca do bairro de lata onde vivo
quero pedir-te que transmitas lá no céu
como vou passar o Natal com a minha mãe.
Tenho dez anos e nunca tive um brinquedo
a não ser daqueles que nós fazemos
com arame, carros com rodas e tudo e volante.
Desde que cheguei de África que moro aqui
nesta casa de madeira sem luz, sem água
e só a lua acende as ruas estreitas, tão estreitas
que chego a bater nas casas com os cotovelos.
Nunca fui à escola e não sei ler nem escrever
por isso pedi ao meu amigo menino para fazer
uma carta. é tão estranho a caneta dele desliza
sinais no papel das coisas que eu digo que é
difícil acreditar que as minhas palavras ali estão.
Às vezes espreito pela grade da escola que fica
ali perto e vou ver os meninos no recreio a brincar
quando a minha mãe diz para ir comprar pão
no senhor Inácio porque o dinheiro eu conheço
dez, vinte, cinquenta, as moedas e as notas.
Senhor Pai Natal, eu só queria… olha, já disse
que não quero brinquedos! (…)
Ah, sabes, neste bairro que não é bairro
não vem a camioneta buscar o lixo,
o carro que vem é a carroça dos cães para os levar,
não fazem mal a ninguém mas eles dizem que são vadios,
os cães têm dono mas eles não querem saber
e dizem que são nossos amigos, os cães.
Vem também um senhor padre dizer
para irmos à missa rezar
mas a minha mãe e eu não temos tempo é preciso
ir buscar água a uma torneira que uma senhora pôs
no quintal para a gente. E quando
vou à água é que eu vou brincar para a lixeira,
e às vezes trago uma lanterna velha, um secador
que trabalha mas a minha mãe não precisa dele
porque tem o cabelo curto e é carapinha.
Vou dizer ao meu amigo para ler esta carta em voz alta
para saber se ele não se esqueceu de alguma coisa
até porque a minha mãe está a chamar-me para
pôr uma bacia a apanhar a água que está a cair
em cima da cama. Está a chover muito.
Agora lembrei-me: tu que és o Pai Natal,
o mensageiro de Deus e portanto sabes onde
está tudo porque vais dar as prendas a toda a gente,
quando passares por cima da minha casa com o teu
carro de madeira puxado por aqueles animais que têm cornos
e parecem árvores, no dia de Natal, faz-me só um sinal
um sinal só para mim, só para mim.
e não te esqueças: lembra-te da minha mãe.
Autor desconhecido
Texto selecionado e adaptado pela disciplina de EMRC